quarta-feira, 16 de julho de 2008

Esquerda e Direita



Tem gente que foge de assuntos polêmicos e procura situar-se no lugar comum dos argumentos, note-se que lugar-comum nada tem a ver com meio termo. O problema é que é justamente nestes “lugares-comuns” que reside o embrião dos enganos e engodos. Eu, às vezes sou impulsivo ao falar, ao dar pitacos em assuntos em que os mais prudentes ou espertos se calam. Num debate sobre direita e esquerda, há alguns anos no Instituto de Artes da UFRGS, depois de ouvir alguns chavões, resolvi falar, rapidamente, ainda tinha esse detalhe, um assunto tão complexo, talvez o mais complexo de todos, ser analisado rapidamente. Disse eu: em linhas gerais a direita é formada por indivíduos defendendo exclusivamente interesses pessoais ou corporativos. Já à esquerda, em síntese, não são indivíduos, mas um conjunto de idéias, de princípios, defendidas obviamente por indivíduos, mas quando estes ferem esses princípios; liberdade, igualdade e solidariedade, deixam de ser de esquerda, mas a esquerda continua viva enquanto princípio. Rapidamente alguém da plateia disse: quer dizer que quando alguém de um governo de esquerda se locupleta com o dinheiro público a culpa não é da esquerda? Respondi: exatamente isso, o ato de locupletar-se, ao contrário da direita, não está em nenhum fundamento de esquerda, portanto não foi a esquerda que errou, (liberdade, igualdade e fraternidade), mas o indivíduo, que em verdade tomou uma atitude de direita, locupletar-se, que nas suas diferentes expressões, vem a ser o cerne e o objetivo da ideologia de direita, ou seja, o lucro sem limites. Em algumas regiões do planeta isso ocorre com legislações mediadoras, em outras, beirando a escravidão, mas o objetivo sempre é locupletar-se o máximo possível. Já os princípios de esquerda defendem sempre, (condição primeira), os interesses da esmagadora maioria dos indivíduos, no caso da direita, a defesa é a dos privilégios e dos vícios de se atingir esses privilégios. A liberdade do liberalismo em suma, é a liberdade de poder explorar seu semelhante até o limite da escravidão. “Ah, mas e o os trabalhadores coreanos?” Me pergunta outro. Digo: ali o que ocorre é uma pratica de direita, produção capitalista, sem os direitos trabalhistas que a esquerda ocidental a muito custo e sangue conquistou para seus trabalhadores, ou seja; um crime de direita, mesmo que cometido num suposto regime comunista. E a liberdade tão apregoada pelo neoliberalismo requer uma pergunta: liberdade pra quem? Na verdade é a liberdade para imperar a lei da selva, em uma selvageria moderna, onde se aceita tudo que diga respeito à evolução tecnológica no campo da produtividade, enquanto nega-se ou minimiza-se tudo que diga respeito a evoluções humanistas, filosóficas ou qualquer saber humano que venha a questionar o acúmulo e a concentração e substitui-se esse saber humanista por chavões sentimentais/apelativos ou claramente preconceituosos, repetidos a exaustão. Nesse quesito tem papel fundamental às religiões e a mídia que pregam a ideologia de direita, mal disfarçada em uma solidariedade capenga e indigente a confundir e acomodar as populações exploradas. Já a liberdade de esquerda é atrelada à igualdade, pelo menos no que diz respeito às condições iniciais para competir, é competição entre iguais. Mas como toda competição fomenta pérfidos sentimentos, inclusive o de locupletar-se, os mais radicais da Assembléia Nacional Francesa, 1789, que se sentavam à esquerda do presidente da assembleia, por isso “esquerda”, propuseram complementar a base de princípios com o elemento solidariedade, (ajuda ao próximo, cooperação, fraternidade), por ser sentimento humano tão ou mais poderoso, (por estar ligado diretamente à preservação da espécie), que o egoísmo, a inveja e o locupletar-se. A grande idéia foi ao contrário de sufocar defeitos, ofuscá-los acrescentando uma poderosa virtude, daí, surgiram os princípios da esquerda; “Liberté, Egalité, fraternité”, cunhados pelo revolucionário Jean-Nicolas Pache. E assim encerrei minha participação no debate mas depois disso nenhuma afirmação dúbia dos palestrantes ficou sem questionamento, a plateia de estudantes parece que despertou e começou a fustiga-los enquanto eu saía de fininho.

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